Mitos e Verdades sobre Pescado

MITOS E VERDADES SOBRE PESCADO<br />

Ao longo do tempo, os ecossistemas marinhos e dulçaquícolas evoluíram, e o pescado tornou-se uma fonte essencial de nutrição. No entanto, muitos mitos continuam a rodear o seu consumo e valor nutricional.

Descubra as verdades e desmistifique os equívocos sobre o pescado e o seu papel crucial na saúde humana.

1. Portugal é um país de elevado consumo de pescado?

Verdade: Portugal é um país de forte tradição no que respeita a produtos do mar e, de acordo com a European Market Observatory for Fisheries and Aquaculture Products (EUMOFA), Portugal é líder na Europa com um consumo per capita de 59,9 kg (EUMOFA 2020).

2. O termo “Pescado” é sinónimo de Peixe?

Verdade: por Pescado, entende-se um vasto conjunto que engloba peixes (ósseos e cartilaginosos), mas também os crustáceos e moluscos (bivalves, cefalópodes e gastrópodes). Assim, pescado e peixe são sinónimos, mas em sentido lato do termo.

3. O pescado consumido em Portugal é maioritariamente proveniente de aquicultura?

Mito: de acordo com dados recolhidos pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), em 2022 foram capturadas pela frota portuguesa 165 801 toneladas de pescado, mas que corresponde a um decréscimo de 10,6% na produção da pesca nacional em relação ao ano transato. Já a produção aquícola total em 2021 foi de 17 900 toneladas, representando um acréscimo de 5,3% face a 2020 (INE, 2023).

4. O peixe, enquanto produto de origem animal, confere vantagens nutricionais face a dietas que não incluam produtos animais?

Verdade: o peixe é considerado um alimento bastante completo que fornece proteínas de elevada qualidade biológica de fácil digestibilidade e que contém todos os aminoácidos essenciais. Apresenta uma gordura de elevada qualidade e pobre em colesterol; fornecedora de todos os ácidos gordos essenciais, que confere grande palatabilidade; é ainda fonte de vitaminas lipossolúveis, de minerais e de micronutrientes e pobre em hidratos de carbono.

5. Será que as dietas mais saudáveis devem evitar gordura de origem animal, mesmo incluindo o pescado?

Mito: parece um paradoxo, mas no que diz respeito ao peixe, a recomendação é de que sejam consumidas espécies gordas, mas respeitando a Roda da Alimentação e a Pirâmide da Dieta Mediterrânica. Assim, de acordo com a Roda da Alimentação, devem ser ingeridos diariamente entre 1,5 e 4,5 porções de alimentos do grupo Carnes, Pescado e Ovos, sendo que uma porção de pescado corresponde a 30 gramas (em cru). Já a Pirâmide da Dieta Mediterrânica sugere o consumo de 2 ou mais porções de peixe por semana.

6. São os peixes todos idênticos em termos da sua gordura?

Mito: os peixes apresentam grande variação de gordura, de tal forma que existe uma classificação com base no conteúdo em gordura. Os Peixes são classificados de acordo com o teor de gordura (expresso por 100g) em 4 grandes categorias: peixes magros (≤ 2%); peixes de baixo teor em gordura (2-4%); peixes com teor médio de gordura (4-8%) e peixes com elevado teor de gordura (≥ 8%). De acordo com a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), os peixes também podem ser classificados de acordo com o órgão onde armazenam a gordura: os peixes magros armazenam a gordura no fígado; os peixes semi-gordos depositam a gordura em alguns tecidos e os peixes gordos, armazenam a gordura em células adiposas em diferentes partes do organismo, incluindo o músculo.

7. É a gordura do peixe idêntica à gordura dos mamíferos terrestres e aves?

Mito: a gordura dos peixes é constituída por os ácidos gordos monocarboxílicos de cadeia linear não ramificada com um número par de átomos de carbono unidos entre si por ligações covalentes simples ou duplas. Numa extremidade existe um átomo de carbono que se encontra ligado a 3 átomos de hidrogénio formando o grupo metilo (H3C-), e na outra extremidade da cadeia tem-se o grupo carboxilo (-COOH), também denominado por grupo terminal. Os ácidos gordos mais comuns são aqueles cujas cadeias variam entre C4 e C22 átomos. Os ácidos gordos podem ser de vários tipos. Por definição, os ácidos gordos saturados não possuem nenhuma ligação dupla e os ácidos gordos monoinsaturados têm somente uma ligação dupla. Os ácidos gordos polinsaturados contêm duas ou mais ligações duplas interrompidas por um único grupo metileno (CH2) e incluídos nestes últimos têm-se os ácidos gordos altamente insaturados, sempre que contenham várias ligações duplas (4, 5 ou 6). Assim, a gordura do pescado, em particular do peixe, inclui mais de 40% de ácidos gordos de cadeia longa altamente insaturados, designados por LC-PUFA (long chain polynsaturated fatty acids, em inglês), caracterizando-se por apresentar 4, 5 ou 6 ligações duplas, sendo distintos dos ácidos gordos presentes na gordura dos mamíferos terrestres, que raramente contêm mais que 2 duplas ligações.

8. É indiferente o consumo de peixe dulçaquícola e de peixe marinho, para a obtenção de ácidos gordos ómega-3 (FA-ω3)?

Mito: A ecologia trófica e o nível trófico influenciam a disponibilidade e a capacidade de biossíntese de LC-PUFA nos peixes. Assim, a deposição dos ácidos gordos no pescado está intimamente relacionada com as cadeias tróficas, na medida em que os produtores primários das cadeias tróficas marinhas e dulçaquícolas são distintos em termos de perfil de ácidos gordos. Os peixes marinhos são caracterizados por elevados níveis de ácidos gordos polinsaturados de cadeia longa ω3 devido a uma presença mais forte da série ω3 na sua cadeia trófica. Já os peixes dulçaquícolas apresentam níveis superiores de ácidos gordos em C18 e quantidades apreciáveis de AA, EPA e DHA, na medida em que apresentam uma maior capacidade de alongar e de dessaturar os ácidos gordos.

9. Estão as alterações climáticas a alterar a gordura do pescado e o valor nutricional da sua parte edível?

Verdade: espécies de águas frias apresentam um perfil de ácidos gordos altamente insaturado para manter a estabilidade das membranas biológicas, enquanto as espécies de águas tropicais e quentes, se caracterizam por um perfil de gordura com uma grande percentagem de ácidos gordos saturados no seu perfil, a fim de cumprirem a mesma função. Deste modo, espécies de águas frias, que tradicionalmente são muito ricas em LC-PUFA, com o aquecimento global, podem tornar os seus perfis lipídicos menos insaturados.

10. São as espécies de pescado marinhas as mais recomendadas para consumo na medida em que são ricas em LC-PUFA- ω3?

Verdade: os dois ácidos gordos mais importantes para a saúde humana são o ácido eicosapentaenoico (EPA) e o ácido docosahexaenoico (DHA), sendo ambos LC-PUFA. Sendo distintos quimicamente, os seus efeitos também são diferenciados. O EPA tem reconhecido efeito anti-inflamatório e ao nível de prevenção cardiovascular enquanto o DHA tem efeito ao nível do desenvolvimento da retina e do encéfalo, sendo crucial nos períodos quer de gestação quer de amamentação. Como exemplo de espécies ricas nestes ácidos gordos salientam-se as diversas espécies de salmão, a sardinha, a cavala, o atum e o arenque. Claro que, o consumidor deverá ter em consideração também outros fatores para além da gordura do pescado, nomeadamente se a espécie é pelágica (vive na coluna de água) ou demersal (fundo oceânico), por causa de problemas de poluição dos ecossistemas e das teias tróficas.

 

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ACravador

Por:

Maria João Lança

Investigadora do MED integrada no Grupo de Investigação Ciência e Tecnologia dos Alimentos & Professora Associada da Universidade de Évora

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