7 Junho – Dia Mundial da Segurança dos Alimentos | Contaminantes ambientais e segurança dos alimentos
Autoria de Ana-Lourdes Oropesa Jiménez | Departamento de Saúde Animal, Unidade de Toxicologia, Escola de Medicina Veterinária, INBIO C+G Research Institute, Universidade da Extremadura, Espanha (aoropesa@unex.es) & Fernando Capela e Silva | Departamento de Ciências Médicas e da Saúde, Escola de Saúde e Desenvolvimento Humano, MED-Mediterranean Institute for Agriculture, Environment and Development & CHANGE-Global Change and Sustainability Institute, University of Évora, Évora, Portugal (fcs@uevora.pt)
Em 20 de Dezembro de 2018, a Assembleia Geral das Nações Unidas adoptou a resolução 73/250, que proclama o Dia Mundial da Segurança dos Alimentos. A partir de 2019, o dia 7 de Junho é um momento para celebrar a importância de uma alimentação segura, pretendendo-se sensibilizar as pessoas sobre os seus benefícios, e promover e facilitar acções no sentido de prevenir a transmissão de doenças pelos alimentos [1], a nível local, regional, nacional [2] e global [3,4]. Com uma estimativa anual de 600 milhões de casos de doenças de origem alimentar, os alimentos não seguros constituem uma ameaça para a saúde humana e para as economias, afectando de forma desigual as pessoas/populações vulneráveis e marginalizadas, especialmente as mulheres e as crianças, e as afectadas por conflitos e os migrantes, com um valor anual estimado de 125.000 mortes [1].
O acesso a alimentos seguros, e nas quantidades consideradas adequadas do ponto de vista nutricional, é fundamental para sustentar a vida e promover uma boa saúde. As doenças transmitidas por alimentos são geralmente de natureza infecciosa ou tóxica, causadas por bactérias, vírus, parasitas, contaminantes ambientais, de origem inorgânica e orgânica, designadamente pesticidas, metais, resíduos de medicamentos veterinários e humanos, toxinas, e que entram no corpo através de alimentos ou água contaminados, não sendo, em muitos casos, detectáveis de forma imediata [1,5,6]. A segurança dos alimentos desempenha, assim, um papel fundamental para garantir que os alimentos permanecem seguros em todas as fases da cadeia alimentar – desde a produção até à colheita, processamento, armazenamento, distribuição, até à sua preparação e consumo [1,7].
É sabido que poluição ambiental, segurança dos alimentos e saúde humana estão intimamente relacionadas. As actividades industriais, agrícolas e pecuárias representam as principais fontes de emissão de poluentes para o ambiente (ar, solo e água), actuando estas como matrizes de exposição para os organismos vivos (plantas e animais) e, em última análise, para os seres humanos através da dieta [8] (Figura 1). É ainda importante referir que existem evidências de efeitos acentuados das alterações climáticas na variabilidade e nos riscos existentes e emergentes para a segurança dos alimentos [9,10]. Das várias fontes de contaminação iremos falar apenas dos pesticidas e dos metais pesados.
Figura 1. Poluição ambiental, segurança dos alimentos e saúde humana
Compostos orgânicos persistentes (POPs), como pesticidas (DDT, HCB, …), bifenilos policlorados (PCBs), dioxinas (PCDDs) e furanos (PCDFs), emitidos no meio ambiente pelas atividades agrícolas e industriais, são compostos muito resistentes à degradação ambiental, sendo que o seu caráter lipofílico favorece a bioacumulação e a biomagnificação através das cadeias tróficas, atingindo o nível superior representado pelo ser humano que é exposto aos referidos contaminantes ambientais através do consumo de alimentos [11]. Embora seja verdade que o seu uso é proibido, ou que os processos industriais devem ser controlados, para evitar a geração secundária de alguns deles (PCDDs e PCDFs), por serem compostos muito persistentes ambientalmente, os seus metabolitos continuam a ser detectados, muitas vezes em matrizes ambientais e organismos vivos [12]. Os alimentos com alto teor de gordura (carne, leite e peixe) são os que acumulam este tipo de contaminantes, estando relacionados com o desenvolvimento de vários distúrbios e doennças [7], e, especificamente os PCDDs, foram classificados como cancerígenos para o organismo humano (Grupo 1) pela IARC (International Agency for Research on Cancer; https://www.iarc.who.int/). A ingestão de vegetais pode ser também uma via de exposição humana aos pesticidas organofosforados e carbamatos utilizados em determinadas práticas agrícolas. A intoxicação associada a essas substâncias causa problemas neurológicos, respiratórios e digestivos [11] e, embora muitos deles estejam atualmente proibidos na União Europeia, existem outros cujo uso é ainda permitido.
Outra questão relevante para a saúde humana é a que está associada à ingestão de alimentos que transportam metais pesados e metalóides como chumbo (Pb), cádmio (Cd), arsénico (As) e mercúrio (Hg). As principais fontes de contaminação por metais pesados e metalóides para o compartimento terrestre são as actividades industriais (minas, fundições, indústrias químicas, indústrias têxteis ou de couro, cimento, etc.), a utilização de estrume e/ou sedimentos de esgoto como aditivos agrícolas, a rega com águas residuais, bem como a utilização de metalopesticidas [13]. Em algumas regiões, como África e Ásia, as águas residuais são utilizadas, sem tratamento adequado, para irrigar culturas, a fim de garantir a produtividade agrícola, enquanto na Europa a contribuição de elementos metálicos nas culturas provém fundamentalmente de práticas agrícolas intensivas.
Uma vez acumulados no solo, esses elementos podem ser capturados pelas raízes e transferidos para as plantas destinadas ao consumo humano, podendo também receber deposições atmosféricas. O Cd é um elemento com alto potencial carcinogénico, classificado pela IARC no Grupo 1, e que aparece em altas concentrações no arroz, tal como concentrações excessivas de As são encontradas em vegetais comestíveis e na água potável [14]. As ervas aromáticas (orégãos, tomilho,…), muito utilizadas como condimentos na culinária na dieta mediterrânica podem ser outro potencial veículo de ingestão de elementos metálicos (Pb, Cd e As) [15]. A ingestão de infusões das chamadas plantas medicinais (hortelã, tomilho, camomila, valeriana, cavalinha, chá vermelho e chá verde, …) pode igualmente constituir uma via de exposição a metais pesados (Hg, Pb e Cd) e metalóides (As), embora seja verdade que não representam grande risco para a saúde do consumidor, pois são encontrados em concentrações muito baixas devido ao efeito de diluição das folhas da planta na água [16].
Os metais podem ser transferidos para os animais e seus produtos (carne, leite e ovos), através das espécies vegetais que os acumulam e que lhes servem de alimento [14,17-19]. Deste modo, o consumo continuado de produtos vegetais (frutas, vegetais folhosos, cereais e tubérculos), bebidas alcoólicas de origem vegetal e produtos de origem animal [carne (20) e leite (21)] que tenham acumulado elementos metálicos, mesmo em níveis vestigiais, pode representar um risco para a saúde humana. Por outro lado, o Hg na sua forma orgânica (metilmercúrio) sofre processos de bioacumulação e biomagnificação nas cadeias alimentares aquáticas, o que faz com que os peixes encontrados em níveis tróficos superiores (peixe-espada, imperador, atum, etc.) acumulem concentrações significativas de metilHg, sendo o consumo da carne e derivados destas espécies, a principal via de exposição humana ao Hg [11].
A segurança dos alimentos é, pois, uma prioridade em termos de saúde pública [22], desempenhando um papel fundamental no desenvolvimento de políticas e quadros regulamentares e no estabelecimento e implementação de sistemas eficazes de segurança alimentar, com a indicação dos límites máximos de resíduos para os contaminantes ambientais em todos os produtos [7], em toda as fases da cadeia alimentar – desde a produção até à colheita, processamento, armazenamento, distribuição, até à preparação e consumo – a nível local, regional, nacional [2] e global [3,4]. O reconhecimento desta prioridade está implícita em alguns dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030 [23] (Tabela 1).
Estima-se que a população humana global atinja 9,7 mil milhões de pessoas até ao ano de 2050, o que implica que a produção de alimentos, aumente em mais de 50% relativamente aos níveis de produção de 2012 [24]. Para isto, e no sentido de concretizar as metas definidas nos ODS, é necessária uma abordagem holística e sistemática, aplicada à produção sustentável de alimentos, à gestão ambiental e às seguranças dos alimentos e alimentar, ou seja uma abordagem “Uma Saúde”, garantindo, assim, que estas pessoas tenham acesso a alimentos seguros, nutritivos e saudáveis, preservando ao mesmo tempo os recursos naturais em benefício das gerações futuras [25,26].
A segurança dos alimentos depende de todos e, nesse sentido, enquanto consumidores devemos seguir boas práticas para evitar, na medida do possível, a exposição oral a contaminantes ambientais, através, entre otras medidas: do consumo de alimentos de fornecedores confiáveis que garantam que esses alimentos foram submetidos a inspeções sanitárias; da lavagem de legumes e frutas antes do consumo e/ou descascando os frutos, eliminando assim possíveis contaminantes ambientais que tenham sofrido processos de deposição sobre os mesmos; do consumo de produtos alimentares biológicos; do consumo limitado de peixes de grande porte (especialmente nos grupos de risco mencionados) devido à sua acumulação de Hg; do consumo controlado de carne ou produtos de origem animal com alto teor de gordura onde contaminantes persistentes tendem a acumular-se. Estes preceitos serão ainda mais importantes para certos sectores da população, como mulheres grávidas, crianças, idosos, e imunocomprometidos, uma vez que os efeitos derivados da exposição a contaminantes ambientais através da dieta podem ser mais graves do que na população em geral.
Nota: Esta iniciativa de divulgação foi realizada em conjunto com a Universidade da Extremadura, que t
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Referências
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[2] DGAV. 2. Garantir a Segurança dos Alimentos (https://www.dgav.pt/alimentos/conteudo/generos-alimenticios/garantir-a-seguranca-dos-alimentos/. Consultado em 5 de Junho de 2024).
[3] European Comission. Food Safety (https://food.ec.europa.eu/index_en. Consultado em 5 de Junho de 2024).
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